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Entre as diversas oportunidades, o investimento focado no agronegócio ganha vantagens nas atuais condições econômicas

Idalicio Silva*

Agosto de 2015 – A vida de quem vive de investimentos não é fácil. Num ambiente onde administrar as perdas ganha espaço, a estratégia dominante é o “play safe”. O caixa vira um ativo valioso e só saem recursos em condições de baixo ou nenhum risco. A situação recessiva da economia sempre provoca a destruição de valor. A estratégia de investimento e crescimento financeiro deve buscar o resultado positivo do ativo, seja pelo pagamento em dia das operações de crédito ou pelo dividendo, concluindo o exercício da atividade comercial. Sempre é possível trabalhar vendido (ou short, no jargão do mercado), mas a porta é muito estreita para o tamanho da manada.

Ultrapassado o temor de que o mundo pode acabar antes do fim de semana chegar, os alocadores mais experientes começam a avaliar as boas oportunidades, de verdade. É como procurar as pechinchas do Black Friday. No final, é preciso ampliar a visão num horizonte mais longo, ignorando os ruídos do curto prazo. Superado o medo da ruptura, há ativos com bons retornos e riscos assimétricos.

Onde devem surgir as boas oportunidades do mercado?

  1. Renda fixa será o carro-chefe – em condições recessivas, os ativos de renda fixa apresentam quase sempre desempenho superior aos demais. Como manda a cartilha da renda fixa, um período recessivo é acompanhado pela queda dos juros, que valorizam os papéis pré-fixados. Para assistirmos a esse movimento, há a necessidade de se recordar dois temas também atuais:
  2. Inflação: à medida que o calendário corre e a taxa de desemprego se amplia, fica cada dia mais factível o alvo de 4,5% de inflação para 2016.
  3. Contas públicas: o mercado financeiro sofre por antecipação. A inclinação da curva de juros do Brasil, medida pela diferença entre a taxa de juros de longo prazo e a taxa de juros de curto prazo, seria mais negativa sem o risco do downgrade do Brasil junto às agências de classificação de risco. É possível identificar uma assimetria nessa inclinação. Uma acomodação das expectativas das agências de risco tem potencial de ampliar a inclinação negativa, ao passo que o downgrade deve ter pouco efeito sobre a atual inclinação da curva.
  4. Ativos ligados aos setores de exportação – quem perdeu a alta do dólar ainda pode se beneficiar da sua derivada. O reaquecimento das economias maduras, alinhado à mudança de patamar do câmbio, premiou significativamente os exportadores. A desvalorização de mais de 50% da moeda brasileira é uma injeção direta na saúde financeira dos exportadores. Seja com alvo no incremento de margem ou na melhor condição financeira, o mercado de ações e crédito são ativos valiosos (ver abaixo).
  5. Crédito – num ambiente onde os lucros mínguam, a busca por um retorno constante é mais favorável que a aposta no crescimento dos lucros. Empresas precisarão ajustar custos frente às novas condições de vendas para então assistirem a recuperação dos lucros. O crédito assumirá o papel de ativo de risco nos portfólios.
  6. Agronegócio – uma das poucas atividades onde o Brasil é realmente competitivo no longo prazo. Referência em produtividade e sustento do PIB brasileiro, esse setor atrairá o capital que busca condições financeiras saudáveis. Uma notícia positiva é que a queda dos preços das soft commodities, da ordem de 35%, foi neutralizada pela elevação da moeda estrangeira (cerca de 50%); o câmbio equilibrou a conta e neutralizou o impacto no preço de venda dos produtos. Comparativamente, o Brasil tem situação privilegiada perante os demais produtores do mundo, uma vez que é o País com a moeda mais desvalorizada desde o início do declínio de preços das commodities. Setores como a pecuária são ainda melhores, que não sofreram queda de preços e tiveram aumento da demanda, com a ampliação do número de países importadores da proteína brasileira.
  7. Saúde e educação – os setores de saúde e educação sempre conferiram bons retornos em épocas de crise. Cruelmente, durante recessões, há aumento de demanda por pessoas que buscam melhorar o bem-estar e a qualificação.
  8. Produtos incentivados – em tempos de vacas magras, toda economia é bem-vinda. Os títulos isentos de impostos representam um incremento de receita na veia dos investidores. A demanda por ativos com esse benefício deve sustentar os preços desses ativos.
  9. Ações de empresas médias – a combinação de bolsa em queda e câmbio elevado coloca algumas empresas em preços atraentes para corporações e investidores estrangeiros que tenham objetivo de expandir negócios na América Latina. É esperada grande atividade de fusões e aquisições no mercado. É um case de stock picking, mas uma lição de casa bem feita pode ser extremamente rentável.

Se essas são as flores do mercado, vejamos agora os espinhos da vez:

  • Mercado imobiliário – é pouco provável que assistamos a recuperação do mercado imobiliário antes da estabilidade da taxa de desemprego. Os preços de imóveis subiram motivados pelo aumento da riqueza da economia, mas em larga medida pelo endividamento com o aumento da oferta de crédito. Ainda que o ajuste dos rendimentos de aluguéis aconteça quando os juros iniciarem o movimento descendente, haverá alguma dúvida sobre a precificação do ativo que compõe o patrimônio de fundos imobiliários. Pelo lado das incorporações, a situação é pior com excesso de estoque do lado da oferta e demanda comprometida, por desemprego alto e crédito mais caro.
  • Importação – no movimento contrário da última década, o setor de importação amargará uma ressaca pela perda de competitividade com o mercado nacional. Câmbio elevado e consumo fraco farão os produtos estrangeiros evitarem a fronteira brasileira.
  • Bens de consumo básicos – empresas de bens de consumo básico (o famoso Consumer Staples americano) são os ativos procurados na bolsa para proteção pela baixa volatilidade de resultados. Entretanto, é pouco provável que ainda exista algum ativo dessas empresas que possam ser chamadas de oportunidades.
  • Fundos multimercados – mesmo com enorme risco de morder a língua, cabe o comentário : é bem possível que veremos os fundos multimercados com retornos sofríveis na segunda metade do ano ou até depois disso. Com o CDI elevado como referência e com estratégia de diversificação na descrição central de seus mandatos, parece uma aposta alta acreditar que os fundos multimercados terão desempenho superior à alocação direta nas classes de ativos descritas aqui, com menor risco e com desconto da taxa de gestão.

Cabe a ressalva que, apesar de não achar o mercado imobiliário uma boa classe de ativo para investimento, acredito que será um bom momento para a aquisição da moradia própria. Explico: o alto endividamento das famílias alinhado à falta de emprego provocará execuções dos imóveis inadimplentes. A manutenção de um estoque imobiliário é algo oneroso aos bancos, provocando a liquidação dos imóveis em leilão. Além disso, a compra à vista vai permitir acesso a descontos polpudos.

No fim, tomaremos emprestado um termo que ficou cunhado na recuperação americana: a bumpy road to recovery, o que em português coloquial significa “vamo que vamo” na estrada esburacada.  A surpresa pode vir, claro, da aprovação de alguma reforma micro, mesmo com o baixo capital político atual, mas parece daquelas apostas que deveriam pagar 7:1.

Crescimento é bom e todo mundo gosta, mas se esperarmos ele chegar para avaliar as oportunidades, elas já não serão tão oportunas. Veremos as cenas em seus próximos capítulos.

*Idalicio Silva é diretor de relacionamento institucional da securitizadora Ecoagro

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